Ancorada em pesquisas sobre tempo, território e o legado da terra, a mostra tem abertura no dia 14 de novembro, a partir das 19h

Nas profundezas da memória e na textura viva do barro, a artista Vitória Vatroi inaugura “Dentro das Raízes – Entre Mundos”, uma exposição que é mais que um mergulho estético, pois se apresenta como uma experiência imersiva, multissensorial e em constante metamorfose. Ancorada em pesquisas sobre tempo, território e o legado ancestral da terra, a mostra propõe uma reconfiguração da memória através da fabulação e da co-criação, em um diálogo potente que ressoa com a urgência dos debates ambientais globais, notadamente a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), em Belém do Pará, prevista para novembro deste ano.

A exposição, com entrada gratuita, será aberta ao público na Torre Malakoff, no Bairro do Recife, a partir de 14 de novembro, às 19h. Vitória Vatroi concebe um “mundo subterrâneo, no avesso da terra”, habitado por “criaturas feitas de barro, moldadas pelas forças geológicas” e pelas memórias pessoais e artísticas. Cores, cheiros e texturas se entrelaçam em uma expografia viva, nos quais elementos naturais como plantas, galhos, folhas e cipós criam um ambiente em “decomposição” contínua, celebrando o ciclo da vida e a interconexão intrínseca entre o tempo e a natureza.

Com audiodescrição, disponível via QR code, “Dentro das Raízes – Entre Mundos” busca visibilidade para a rica tradição do barro de Pernambuco e incentiva o interesse por um novo olhar sobre a natureza, transformando o espaço da exposição em um espaço vivo e inspirador para imaginar e criar um futuro em verdadeira integração com o planeta.

Em 11 de dezembro, a montagem da expografia se transformará em uma oficina aberta ao público, conduzida pela artista Vitória Vatroi e pelas bioconstrutoras Edna e  Gabrielly Dantas, da Casa de Sal, empreendimento de bioconstrução com profundo olhar ecológico, conduzido na Ilha de Itamaracá, localizada no Litoral Norte de Pernambuco. A ação convida o público a compor o ambiente, compartilhando memórias e experiências por meio de desenhos, escritos ou modelagens em barro. Além disso, a oficina-instalação oferece aprendizados técnicos em bioconstrução, promovendo um intercâmbio de saberes entre arte, tradição e ecologia.

O texto curatorial é assinado por Nathália Grilo, pesquisadora da Imaginação Radical Negra e curadora de narrativas no estúdio e pavilhão do artista Maxwell Alexandre. Com uma visão investiga a capacidade de pessoas melanizadas de “inaugurar mundos e alcançar futuros mediante manifestações do agora”, Grilo confere ao projeto uma camada de reflexão sobre territorialidade, resiliência e a produção de novas cosmologias.

O Templo Efêmero: a poesia e a fragilidade da Casa de Sal

A união entre a visão artística de Vitória Vatroi e o conhecimento prático da bioconstrução de Maria Gabrielly e Edna Dantas cria um manifesto arquitetônico de fragilidade e urgência. A materialidade da Casa de Sal, que evoca o elemento mineral e a efemeridade das construções sustentáveis, transforma-se em uma poderosa metáfora sobre a vulnerabilidade do planeta. Em um mundo cada vez mais ameaçado pelas mudanças climáticas, a Casa de Sal questiona as estruturas perenes da civilização, instigando o público a refletir sobre o que é construído para durar e o que o tempo e a natureza insistem em dissolver.

“Dentro das Raízes – Entre Mundos nasce do desejo de adiar o fim, escutando o que a Terra tem a dizer. Ao moldar o barro, não crio apenas formas, mas restauro vínculos entre corpo e território, entre o que lembramos e o que a Terra recorda por nós. A exposição é um convite a ouvir a Terra, reconhecendo que ela sonha, sente, fala e a imaginar mundos onde a natureza e o espírito não se separam”, ressalta Vatroi.

Sobre Vitória Vatroi

Com mais de dez anos de trajetória nas artes visuais, Vitória Vatroi atua de forma multidisciplinar e independente. É integrante dos coletivos Arte Negra e Indígena (CARNI) e Trovoa/PE, atuando em pesquisa, direção de arte, cinema e design. Sua prática investiga narrativas impostas à população negra, propondo novos caminhos de escuta e criação a partir do corpo, memória e ancestralidade.

A experiência em Tracunhaém também levou a artista a fundar, em 2024, o Estúdio Mawú, espaço onde desenvolve coleções de luminárias e objetos que misturam arte e design, realiza pesquisas e colaborações com mestres ceramistas e outros artistas visuais. O espaço é continuidade da obra iniciada em Deságue e parte do compromisso de Vitória com saberes artísticos sustentáveis, comunitários e enraizados.

Em julho de 2025, a artista representou Pernambuco na exposição Alumbramento, no Museu Nacional da República, em Brasília, durante o Festival Latinidades. Na ocasião, Vatroi levou na bagagem o filme Deságue, que tem direção e performance da artista. A obra afro-surrealista fabula memórias negras a partir do barro e da terra. Em agosto deste ano, Vitória Vatroi lançou o curta-metragem de animação “Magma – a noite em que ouvi o fogo”, uma criação colaborativa com os artistas At4ci e Fracto. 

Sobre Nathalia Grilo

Nathalia Grilo possui um trabalho que pode ser definido como uma prática multidimensional que intersecciona arte, música, crítica cultural e estudos negros, orientada pela perspectiva da imaginação radical negra. Atua como curadora e pesquisadora, conectando diferentes linguagens artísticas e intelectuais para explorar questões como memória, resistência, espiritualidade, racialidade e transformação social.

Sua trajetória  tem início nos educativos de importantes equipamentos culturais de regiões descentralizadas como CCJ SP, Fábricas de Cultura SP, Redes de Biblioteca Parque RJ (Manguinhos e Rocinha). Criou a Revista diCheiro, o primeiro periódico digital a tratar exclusivamente das estéticas africanas, realiza oficinas educativas como construção de coroas africanas em escolas municipais do Rio de Janeiro e São Paulo, oferece consultorias artísticas para nomes como Xênia França e a marca Lenny Niemeyer, escreve textos curatoriais para galerias e museus, e se tornou criadora de tendências no Spotify. 

Nathalia idealizou e produz os festivais Ayó Encontro Negro de Tradição Oral e Festival Instrumental Mulambo Jazzagrário, ambos acontecem desde 2016 no extremo oeste do Rio de Janeiro. Ao longo do tempo se tornou um perfil influente no Instagram disseminando saberes acerca do surrealismo negro e da Imaginação Radical Negra. Nathalia possui o Jazz como religião. 

Além disso, seu olhar atento para artistas e produções periféricas, aliado ao interesse por cenas experimentais e sonoridades insubmissas, a tornam uma mediadora potente, que não somente amplia repertórios, mas também reivindica espaços e histórias que muitas vezes são silenciados.

SERVIÇO

Exposição “Dentro das Raízes – Entre Mundos”

Local: Torre Malakoff –  Praça do Arsenal, s/n – Recife, PE

Abertura: 14 de outubro, às 19h

Visita guiada, com Vitória Vatroi e Casa de Sal: 30/11, às 14h

Oficina: 11 de dezembro, às 14h

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