Pela primeira vez, trabalho apresentado na feira passa a compor patrimônio museológico
Durante a ART.PE 2025 – Feira de Arte Contemporânea de Pernambuco, realizada de 8 a 12 de outubro, a Galeria Boi protagonizou um marco inédito na história do evento: a obra MUKITA, do artista Edson Barrus Atikum, foi adquirida pelo colecionador Diogo Cantarelli e doada ao Museu do Homem do Nordeste (MUHNE), da Fundação Joaquim Nabuco, em Recife — a primeira doação institucional registrada na feira.
O gesto inaugura uma nova prática dentro da ART.PE, aproximando o mercado de arte das instituições públicas e reforçando o caráter democrático da iniciativa ao transformar uma peça de acervo privado em patrimônio acessível à sociedade. A obra passará a integrar a nova curadoria da exposição de longa duração do acervo do MUHNE, proposta por Moacir dos Anjos, curador, escritor e crítico de arte que atualmente coordena o museu.
“Fico particularmente contente de termos tido, como parceiros nesse projeto de doação, uma galeria situada em Caruaru, o que rompe com os estereótipos de que a produção dita contemporânea (e suas instituições) somente floresceriam nas grandes capitais do país. E, também, pelo fato de o artista Edson Barrus, que produziu Mukita, a obra doada, ter como origem o sertão pernambucano e raízes afro-indígenas, trazendo para sua obra, e para todas essas relações desencadeadas por esse processo, referências simbólicas e construtivas que, embora antigas, estão, ao mesmo tempo, em sintonia com o mundo de agora”, comenta Moacir dos Anjos.
Edson Barrus Atikum nasceu em Carnaubeira da Penha (PE). Indígena urbano do povo Atikum-Umã, é artista multimídia, doutor em Psicologia Clínica pela PUC-SP, mestre em História da Arte/Linguagens Visuais, e fundou e supervisionou, entre 2002 e 2006, o espaço experimental Rés do Chão, no Rio de Janeiro.
“O trabalho de Edson Barrus estabelece múltiplas conexões com o acervo do Museu do Homem do Nordeste — tanto por sua materialidade construtiva quanto por sua relação com a tradição das carrancas, com a cultura afro-indígena do Nordeste e com a escultura contemporânea. Mukita é fruto de um processo criativo que atravessa e reinventa tradições, produzindo algo híbrido e singular. A obra estará em exibição na próxima mostra de longa duração do MUHNE, prevista para inaugurar em junho de 2026”, explica Moacir dos Anjos.
Fundada em 2021 em Caruaru (PE), a Galeria Boi é uma extensão da Primeira Bienal do Barro do Brasil, idealizada pelo artista e diretor Carlos Melo. O espaço atua como polo de pesquisa, documentação e exibição de produções artísticas contemporâneas, com foco em práticas conceituais e contra-hegemônicas, especialmente aquelas oriundas do Agreste pernambucano e de regiões fora do eixo tradicional do circuito de arte brasileiro.
A doação realizada na feira evidencia a importância da cooperação entre galerias, artistas, colecionadores e museus na valorização e circulação da arte contemporânea brasileira. Gestos como este fortalecem a relação entre o mercado e o patrimônio público, contribuindo para a ampliação e atualização dos acervos museológicos e para a democratização do acesso à arte no país.
“A ART.PE, além de proporcionar encontros em diferentes cenários, abre e lança, em seus corredores, ideias como a doação de obras a instituições pernambucanas. Isso é fundamental, pois aproxima colecionadores de museus que são também deles, da cidade e do estado. Estamos muito felizes, pois outras doações aconteceram também para o MAMAM, e a cada edição vamos consolidar essa prática, que a feira pretende sempre defender”, celebrou Diogo Viana, diretor geral e fundador da ART.PE.

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